VASCO PULIDO VALENTE 28/03/2014
- 01:30
O que a crise da Crimeia
claramente deixou ver foi que a América já não é uma potência global
Qual foi o resultado da suposta “confrontação” entre o
Ocidente e a Rússia? A Rússia anexou a Crimeia sem resistência militar ou
outra. O Ocidente manifestou com muito cuidado a sua desaprovação. A América
retirou o visto a meia dúzia de comparsas de Putin e prometeu à Europa que lhe
forneceria gás para a tornar menos “dependente” da Rússia. A Europa e a América
também expulsaram a Rússia dos G8, que voltam agora a ser os G7. O resto não
passou de uma retórica mansa, para consolo da “opinião” com impulsos
alegadamente “democráticos”.
Isto bastou para que “eurófilos” de vária pinta viessem
falar do fracasso de Putin, da “aproximação da Europa e da América” e do
“isolamento” da Rússia; e a farsa, apoiada pela viagem de Obama a
Bruxelas, convenceu quem se
quis convencer.
Infelizmente, as
coisas são, de maneira
geral, ao contrário. Em primeiro lugar, o Ocidente demonstrou ao mundo inteiro
que recusa um novo conflito, na Ucrânia ou no pólo Norte: a América porque, ao
fim de uma guerra perdida no Iraque e no Afeganistão, o eleitorado está
maciçamente contra uma nova aventura; a Europa porque não tem dinheiro, nem
poder militar para ameaçar ninguém (Obama até pediu que a França, a Inglaterra
e a Alemanha investissem em armamento um pouco mais do que investem hoje). E,
em segundo lugar, porque, longe de ficar “isolada”, a Rússia continua,
imperturbável, a receber investimento americano, alemão e até francês; e a
absorver uma parte vital do que a Alemanha e a Inglaterra exportam. Com ou sem
declamações para consumo popular, os negócios não vão ser perturbados.
A Rússia, disse Obama, é uma “potência regional”. Este
exemplo de arrogância, e de inconsciência, não muda a realidade. O que a crise
da Crimeia claramente deixou ver foi que a América já não é uma potência
global. Não admira que a China se aproximasse da Rússia; e que, na África e na Ásia,
se fale cada
vez com maior insistência
na “hipocrisia americana” (para não falar na “hipocrisia europeia”). Como não
admira que a sra. Merkel, depois de se aliviar de umas frases pias, se
preocupasse sobretudo em defender o interesse económico da Alemanha na
Federação Russa. A América e a Europa saíram muito mal da suposta “confrontação”
com Putin: sem unidade e sem iniciativa. Pior ainda: tão “apaziguadores” como
os velhos de 1930, anunciaram em Bruxelas que reservam a sua verdadeira cólera
para o caso de a Rússia persistir numa política de expansão, que Putin, por
enquanto, rejeita. Mas que, se a confusão e a irresponsabilidade do Ocidente
não acabarem depressa, não rejeitará sempre.
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