Divisão Enquanto russos e arménios celebram, os tártaros receiam uma Crimeia pró-Moscovo
A grande angústia dos tártaros
Maioritariamente russa, a Crimeia é um mosaico de nacionalidades. As reações das diferentes comunidades aos recentes acontecimentos cobrem um vasto espectro de sentimentos, que vão da euforia dos russos e da alegria dos arménios ate à apreensão de alguns ucranianos, que já pensam em partir para a "Ucrânia continental”. O caso extremo é o do medo dos tártaros (12% da população da Crimeia).
Perante a perspetiva de voltar para os braços da Rússia, à boca dos tártaros uma palavra assoma imediatamente: deportação. Acusados de colaboracionismo com os ocupantes nazis, no final da Segunda Guerra Mundial os tártaros da Crimeia foram deportados em massa para a Ásia Central por Estaline. Esta foi a única comunidade étnica a manifestar-se pela manutenção da integridade territorial da Crimeia, muito embora se saiba que a boicotar em massa o referendo de 16 de Março.
“Não queremos viver com os russos, com eles não sobreviveremos, porque isso já aconteceu aos nossos antepassados, sabemos muito bem como é que isto tudo acaba”, diz um jovem que apenas quer ser identificado como Arseni. Vestido de negro, este jovem alto e esguio afasta-se silenciosamente do cemitério muçulmano de Abdai, onde acaba de ser sepultado Reshat Ametov.
Raptada no final de uma manifestação pró-Ucrânia no dia 3 de Março, o seu corpo foi descoberto no início da semana com marcas de tortura.
“Vamos esperar que os nossos anciãos nos digam o que fazer, esperemos que seja possível resolver tudo pacificamente, mas estamos preparados para o que for preciso", diz Tajev, um jovem de barba arruivada. Se lutar para se defender é uma possibilidade admitida por muitos, sobretudo entre os mais jovens, voltar a partir da terra que consideram sua está fora de questão: “Partir?! Nem pensar! Sobretudo depois do tempo que tivemos de esperar para podermos regressar à nossa terra!”, exalta-se Tajev.
O peso da História
É sobretudo a memória histórica e o peso do passado que formatam as opiniões do presente, muitas vezes em sentidos diametralmente opostos. “Ao longo da história a Rússia sempre defendeu os arménios, como podemos esquecer o que esse país fez por nós?”, diz Karlen Ovakimian, taxista de 54 anos, cuja família trocou «a Arménia pela Crimeia no inicio do século XX. No referendo votou pela adesão à Rússia e acredita que as leis deste país garantem os direitos das minorias. Em qualquer caso isso parece-lhe irrelevante: “Os arménios sempre estiveram e estarão com a Rússia”.
“As pessoas estão em pânico, estou constantemente a receber telefonemas de gente que diz que prefere fugir", diz Vastl Ovcharuk, ucraniano, um dos poucos ativistas do movimento que se criou na Crimeia para apoiar os protestos da Praça da Independência, em Kiev.
Vasii denuncia a falsidade dos resultados do referendo em que, segundo os dados oficiais, apenas 31.997 eleitores (2,51%) votaram pela manutenção da Crimeia na Ucrânia. Mas não consegue esconder a revolta perante o elevado número de ucranianos que terão votado a favor da integração na Rússia: “São traidores, gente que veio da Rússia e que não compreende este pais”.
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