Deputados e o
presidente dos socialistas, Christian Levrat, em campanha pelo “não” RUBEN SPRICH/REUTBRS
SOFIA LORENA 09/02/2014 - 07:22
Os últimos anos foram de abertura
à Europa, mas um partido propõe impor limites à
imigração que pode provocar um
recuo.
“Se os suíços continuarem a
deixar entrar toda a gente, os cofres não vão aguentar!”
A esmagadora maioria
dos partidos políticos está contra, as organizações do patronato e os
sindicatos também, as sondagens dão a vitória ao “não”. Mas isso não significa
que a iniciativa “contra a imigração de massas” do Partido do Povo Suíço (SVP),
que vai a votos este domingo, já esteja chumbada. “Está completamente em aberto”,
diz o politólogo Lukas Golder.
A seguir ao
Luxemburgo, a Suiça é o país da Europa com mais imigrantes – os estrangeiros
são 23% da população de oito milhões. A maioria destes, 66%, vem de países da
União Europeia (italianos, alemães e portugueses são os maiores grupos) e de
membros do Espaço Económico Europeu (Islândia, Liechtenstein e Noruega).
Desde a entrada em
vigor dos acordos de livre circulação da EU com a Suíça, em 2002, todos os anos
perto de 80 mil cidadãos dos estados membros têm chagado ao país. Gente que
para a direita nacionalista do SVP está a pôr os empregos e os salários dos
suíços em risco.
Segundo um relatório
da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), a Suíça é quem mais beneficia da livre
circulação.
Comparando a receita
fiscal obtida com os imigrantes com os custos administrativos, sociais e de
infraestruturas que lhes podem ser imputados, o saldo é positivo: pelo menos
6,5 mil milhões de francos, um número prudente por não incluir dados mais
recentes, diz Thomas Liebig, o alemão autor do documento.
Com o desemprego de
3,4%, a Suíça é o país mais competitivo do mundo, diz o Fórum Económico
Mundial. Quatro em cada dez novas empresas abertas são fundadas por
estrangeiros, que só em 2013 criaram 30 mil novos empregos. E de acordo com o
Credit Suisse, um quarto do crescimento no consumo desde 2008 pode ser
atribuído aos estrangeiros. “Um posto de trabalho em cada três depende das
trocas com a EU. Nas exportações, a Suíça ganha um franco em três com a Europa”,
diz a Economiesuisse, organização de todos os sectores económicos do país.
Os estrangeiros, a
maioria altamente qualificados, são 22% da força de trabalho. A livre
circulação, afirma a Economiesuisse, “permite recrutar na Europa mão-de-obra
especialidade de que necessitamos e que não se encontra na Suiça.
A reintegração de
quotas estabelecidas anualmente pelo Governo, como pretende o SVP, dificilmente
ficará sem resposta em Bruxelas. “A Suíça não pode ficar só com o que gosta”,
avisou Viviane Reding, comissária da Justiça Direitos Fundamentais e Cidadania,
em declarações aos media suíços. A livre circulação,
explicou, faz parte de um pacote de sete acordos que tanto beneficiam a Suíça,
com 430 mil cidadãos a viver em estados membros, como a UE.
Cabeça e coração
O casamento da Suíça
com a UE sempre foi problemático e os suíços recusaram a adesão em referendos
(1992 e 2001). “A relação já tinha sido muito controversa. Depois, durante um
período, normalizou. Mas nos últimos anos assistimos a um novo fenómeno de
rejeição, centrado no número de imigrantes, esta direita conseguiu fazer passar
a ideia de que eles são responsáveis por muitos problemas”, explica Golder.
“Peço aos suíços que
votem com a cabeça e não com o coração”, disse o ministro da Economia, Johann
Schneider-Amman. “Se tocarmos na livre circulação ameaçamos os postos de trabalho
de cada um.”
Os responsáveis do
SVP desdramatizam os riscos de um corte com a UE - o partido da direita
nacionalista nunca gostou de Bruxelas. Mais: “Muitos suíços consideram que o
seu posto de trabalho está ameaçado ou que estão a concorrer com um estrangeiro
para o seu lugar. Isso tem consequências nos salários. É indesmentível! A livre
circulação de pessoas está a afundar a classe média”, defendeu numa entrevista
ao jornal Tribune de Genève o vice-presidente,
Oskar Freysinger.
Realidade e percepção
Há a realidade e há
percepção da realidade. “Há cidades e estradas cheias. Há zonas onde os preços das
rendas subiram muito”, diz Golder. Mas não é onde
esses problemas mais se fazem sentir que a iniciativa conta com maior apoio:”Pelo
contrário, o apoio ao ‘sim’ vem da sociedade rural e conservadora.
Nestas
zonas, as pessoas ouvem falar dos problemas, da pressão que se sente nalguns
sítios, e têm a impressão que a culpa
é dos europeus que vieram nos últimos anos. É realmente uma questão de
percepção”, afirma o analista do think tank gfs.bern, o mesmo que
realizou as sondagens disponíveis.
No país nos
referendos, onde com 100 mil assinaturas se faz convocar uma consulta, o SVP especializou-se em campanhas. “A
campanha do ‘não’ apostou em sublinhar os riscos de pôr em causa os acordos com
a UE. É a estratégia normal, centraram-se no problema que provocas ao votar
‘sim’, não no problema que a consulta diz querer enfrentar. Neste caso pode não
chegar, o SVP fez uma campanha muito agressiva”, diz Golder.
Números e minaretes
Na maioria dos
cartazes do partido vêem-se macieiras: num deles, há um homem que a derruba e
ao lado surge a pergunta “Abater a nossa prosperidade?”; noutro, as raízes da
mesma árvore despedaçam o mapa da Suíça.
Também houve um
anúncio publicado nos jornais onde surgiam números, estimativas do crescimento
da população e da percentagem desta que será constituída por imigrantes nos
próximos anos. Nenhum corresponde ao que diz o Gabinete Federal de
Estatísticas: em 2060, por exemplo, segundo o SVP, a Suíça terá 16,3 milhões,
incluindo 8,2 milhões de estrangeiros; a estimativa oficial aponta para 2,8
milhões de estrangeiros numa população de 11,3 milhões.
E o que dizem,
afinal, as sondagens? Que em Dezembro eram 37% os suíços que consideram votar
“sim” e que no fim de Janeiro já eram 43% para 50% que diziam ir votar “não”.
Não são só os 7% de indecisos que semeiam dúvidas. “Não estamos num cenário normal. Num referendo, o apoio ao ‘sim’ tende a
diminuir na campanha. Aqui, foi o contrário, diz Golder
Aconteceu o mesmo em
2009, com o referendo que propunha banir os minaretes, as torres das mesquitas:
o “sim” foi ganhando terreno e antes da consulta estava nos 37%. Era um não
problema - os muçulmanos eram 4% da população e havia quatro minaretes no país - até à
iniciativa do SVP. Quando domingo chegou, os suíços baniram mesmo a construção
de minaretes.
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