Luís Reis Pires, Rui Barroso luis.pires@economico.pt
24 de Janeiro de 2015
O BCE não poder fazer tudo sozinho.
A zona euro, os Estados--membro e a Comissão Europeia têm de fazer a sua parte.
O valor do programa anunciado ontem pelo BCE pode ser suficientemente ambicioso para puxar pelas expectativas de inflação e evitar a ameaça de deflação que paira sobre a zona euro.
Já se vai ou não levar finalmente à retoma económica, essa é outra história.
Os economistas contactados pelo Económico aplaudem a medida, mas lembram que não há milagres.
“O ‘quantitative easing’ não é uma bala de prata para os muitos problemas da zona euro, mas deve fornecer alguma ajuda ao crescimento, somando ao estímulo que já está a vir dos preços muito baixos do petróleo e do euro fraco”, diz Howard Archer, economista-chefe da IHS Global Insight para a Europa.
O programa também deverá potenciar a confiança, “aumentando as expectativas de inflação e, dessa forma, reduzindo qualquer tentação dos consumidores de se retraírem nas compras, em antecipação de deflação sustentada”.
No que diz respeito a combater a ameaça de deflação que paira sobre a zona euro – que arrisca agravar a crise de dívida, tornando mais difícil que seja paga -, o ‘quantitative easing’ “parece mesmo ser uma das únicas medidas potencialmente eficazes no actual contexto”, nota Francisco Veloso, director da Faculdade de Economia da Católica.
Mas os seus efeitos no crescimento ainda são difíceis de prever, porque é preciso que os bancos passem para a economia real o dinheiro que vão receber das vendas ao BCE, algo que está longe de estar garantido.
“Podemos levar a água, leia-se o dinheiro, à boca do cavalo, mas não podemos obriga-lo a beber”, resume Daniel Bessa, director-geral da Cotec e ex-ministro da Economia, que aconselha “muita prudência no que se refere à eficácia destas medidas”.
Samuel Rocha Lopes, professor da Universidade Nova e antigo economista do BCE, considera que a compra de dívida “é a medida certa”, mas “a altura é tardia”.
Acredita que alguns impactos do programa “serão imediatos”,mas “grande parte das medidas só terá efeitos no médio prazo”.
E defende que, para resolver uns dos problemas do euro, que é “precisamente o desequilíbrio macroeconómico” entre os diferentes países, o BCE devia ter optado não comprar activos “unicamente seguindo a percentagem de capital de cada banco central nacional”,mas sim atender a factores como, por exemplo, a deflação em cada país, o endividamento do sector privado e a taxa de crescimento”.
Depois, há ainda o problema de o BCE não poder fazer tudo sozinho.
A zona euro, os Estados-membro e as outras instituições como a Comissão Europeia têm de fazer a sua parte para superar a crise.
É esse o alerta de Nuno de Sousa Pereira, presidente da Porto Business School, que admite que o ‘quantitative easing’ “é a única medida de política monetária que ainda pode ter algum impacto”, mas não terá sucesso sozinha.
“É também necessário alterar as expectativas dos agentes quanto à evolução futura da procura e da solidez do projecto europeu”.
É que “uma Europa sem estratégia não atrai o investimento” e isso “não está nas mãos do BCE”.
E há ainda quem acredite que mesmo os efeitos nos preços serão limitados.
“A inflação deverá continuar baixa, apesar destas medidas.
Para que subisse, seria necessário que a actividade económica acelerasse substancialmente, subissem os custos de energia ou a carga fiscal”, diz Filipe Garcia, da IMF - Informação de Mercados Financeiros.
“E nenhum dos três factores parece ser provável no futuro previsível”, conclui.
■ com M.Q. e P.Z.G.
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